Monday, September 10, 2007

Nenhum Sofrimento é em Vão

Série Reflexão Teológica
Russel Shedd

--------------------------------------------------------------------------------

O fato de que a vida não é fácil para a maioria das pessoas confunde a cabeça de ímpios e cristãos. Para os que desacreditam que Deus, se existe, interessa-se pelo que passa na vida dos homens, o sofrimento atinge as pessoas por acaso. Não tem propósito. Se um indivíduo sofre um acidente ou é acometido por uma grave doença, que provoca dores terríveis e constantes, ele suporta tudo porque não tem escolha. Se decide, por força de vontade, aceitar o mal e conviver com o sofrimento que lhe é imposto, o benefício é dificil de abraçar. Não foi a esposa de Jó que disse, “Amaldiçoe a Deus, e morra!” (Jó 2:9)?
O estoicismo grego entendeu que o sofrimento fazia parte da “razão” ou “lógica” do universo. Virtude, para os estóicos, consistiu em descobrir a direção do destino (ou da natureza) e ajustar a vida com ela. Era importante não sentir paixões ou não se submeter às emoções, mas harmonizar-se com o fatalismo dos acontecimentos fora do controle do homem. Indiferença diante do sofrimento era a melhor resposta que o filósofo Zeno e seus seguidores podiam oferecer.
O cristianismo aceita um Deus pessoal, que criou o universo e o homem com inteligência. Quer dizer que o Criador fez e faz tudo com um propósito.
Admite-se que Deus poderia ter feito criaturas sem nervos e sem inteligência. Poderia ter feito o universo sem qualquer sofrimento. Uma vez que admitimos a personalidade de Deus e Seu “eterno poder” (Rm 1:20), é impossível concluir que o sofrimento ocorra por acaso.
Mas, qual seria o propósito de Deus em criar a possibilidade de sofrimento? Biblicamente, podemos responder que o sofrimento tem pelo menos três propósitos distintos.
1. Retributivo ou punitivo
Num universo em que a justiça existe, é inconcebível que pessoas cometam injustiça sem sofrer as consequências, ou nesta vida, ou na vida vindoura. Adolf Hitler teria que sofrer alguma conseqüência pelas atrocidades injustas que cometeu. Quanto sofrimento merece alguém que provocou a morte de vinte milhões de pessoas de maneira tão desumana? Desde a desobediência de Adão e Eva, que foram castigados pelo sofrimento de dar à luz e ganhar o pão com suor e cansaço, até hoje, concordamos que sofrimento vem em retribuição da injustiça.
2. Educativo e exemplar
Uma das maneiras mais eficazes de prevenir a sociedade sobre as consequências horríveis da AIDS é mostrar a um jovem um colega nas últimas fases dessa doença. Um filho mais velho sofrendo uma chicotada ajuda seu irmão a aprender o valor exemplar do sofrimento. Oséias sofreu profundamente em seu relacionamento conjugal com a intenção de exemplificar o amor de Deus pelo Seu povo. Jó aprendeu a pensar mais acuradamente sobre Deus após ouvir Eliú e o próprio Deus chamar sua atenção sobre o erro de seu pensamento.
3. Vicário e redentivo
A Bíblia dá fundamentos firmes para edificar uma teologia do sofrimento redentivo. Especialmente em Isaías, encontramos a descrição do inocente Servo Sofredor a quem Deus castiga para favorecer pecadores. “...Ele foi traspassado por causa das nossas transgressões, foi esmagado por causa de nossas iniquidades” (Is 53:5). Esse versículo mostra esta verdade claramente. No Novo Testamento, Paulo declara que todos são pecadores, mas nem todos têm de sofrer pela injustiça que cometeram. Nas palavras do Apóstolo, “...Todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente por sua graça, por meio da redenção que há em Cristo Jesus. Deus o ofereceu como sacrifício para propiciação mediante a fé, pelo seu sangue, demonstrando a sua justiça” (Rm 3:23-25). É possível escapar das conseqüências do pecado crendo na pessoa de Cristo, que sofreu vicariamente para pagá-los.
Paulo declara sua alegria em sofrer pelos colossenses, completando em seu próprio corpo o que falta das aflições de Cristo, em favor da igreja (Cl 1:24). Estes sofrimentos, não punitivos, têm a finalidade de avançar o Reino contra o inimigo de nossas almas.
Há sofrimento voluntário que glorifica a Deus. O livro “O Sorriso Escondido de Deus”, de John Piper (S. Paulo: Shedd Publicações e Edições Vida Nova, 2002) apresenta esta verdade de maneira maravilhosa.
Mesmo depois desta discussão tão limitada, sentimos a necessidade de uma explicação mais ampla pelo sofrimento de inocentes, tais como crianças com AIDS ou que nascem deformadas. Muitos passam fome sem culpa própria, mas por causa da corrupção e da má administração dos recursos do país. Muitos sofrem porque nasceram numa terra onde o Evangelho não chegou ou não provocou impacto suficiente para mudar as injustiças praticadas pelos governantes. Mas o cristão sabe que nenhum sofrimento é em vão. O que precisamos é paciência e aguardar o dia em que a gloriosa justiça de Deus será dispensada perfeitamente. “A terra se encherá do conhecimento da glória do Senhor, como as águas enchem o mar” (Is 11:9).


Rev. Russel Shedd é editor da Bíblia Vida Nova.

No comments: