Saturday, July 14, 2007

Arrume o telhado

SÉRIE DISCIPULADO
Heliel Carvalho

Pensando e repensando sobre discipulado, peguei em minha biblioteca o Livro “o Discípulo” de Juan Carlos Ortiz. Fiquei assustado com a atualidade e visão abrangente do livro apesar de toda simplicidade e ser publicado pela primeira vez, em inglês, há mais de 36 anos.
E ao comentar no capítulo 13 sobre o título "membros ou discípulos", Ortiz faz uma observação perspicaz. Ele escreve: “O que significa ser membro da igreja hoje em dia? Quase todas as igrejas fazem três exigências: 1) O membro deve freqüentar as reuniões; 2) O membro deve contribuir; 3) O membro deve ter um bom caráter. Se estes três requisitos são satisfeitos, ele é considerado um bom membro da igreja. Então ele é como um sócio de um clube qualquer – freqüenta a sede, paga as mensalidades e procura não envergonhar sua agremiação.”
Como esta informação é atual, apesar de desatualizada. Desatualizada não por culpa do autor, mas porque na pós-modernidade amadurecida o que manda é a pluralidade. Assim hodiernamente além desta opção de membresia da igreja descritas acima, temos as mais diversas variações que gostaria de ponderá-las utilizando para isso um paralelo com as operações matemáticas. Vejamos:
Subtração. Algumas igrejas subtraíram o terceiro item, ou seja, você precisa freqüentar e ofertar, principalmente este, mas com o caráter não é necessário se preocupar, afinal “nascemos para ser cabeça e não calda” e pra chegar lá “vale gol até de mão”. Vive-se a ditadura do estético no lugar do ético. Em entrevista a revista Ultimato (julho-agosto 2007, p. 36) o teólogo colombiano Batista e escritor, Harold Segura comenta que dentro das fileiras evangélicas já observam os primeiros sinais do “protestantismo popular”, de “analfabetismo bíblico” e de “separação entre fé e ética”. Que situação lamentável! E ainda aproveitando a deixa de Segura, percebemos também que se subtraiu o conhecimento bíblico, isso porque colocou-se inúmeros apetrechos aos cultos em detrimento da pregação. Agora se a pregação bíblica tivesse multiplicado, mesmo que não acrescesse o número de membros, o que é difícil acontecer, não estaríamos na situação que nos encontramos. Subtraíram também na contribuição, pois na década em que Ortiz escreve contribuir significava dizimar, hoje, significa dar o que pode. "Dízimo é coisa do Antigo Testamento", dizem eles, nós estamos vivendo na graça e cada um dá conforme quer e quando pode.
Multiplicação. Outras igrejas multiplicaram. Especialmente quanto ao 2º e 1º item. Assim, deve-se dar mais e mais: a casa, o carro e o que tiver, pois Deus lhe dará o dobro. A troca é garantida e rentosa. A questão em jogo não é o reino, mas é a igreja, ou melhor o “pastor”. Multiplicaram também na freqüência. “Se você quiser receber a benção, deve participar das reuniões todos os dias”, especialmente se for campanha, “pois se falhar um dia sequer, perderá a benção” e terá de começar tudo de novo. Já ouvi de pessoas perdendo a família, com os filhos todos treslocados, pois os pais saíam correndo do serviço e tinha que ir para a igreja todos os dias da semana, chegando em casa tarde da noite. Sem nenhum tempo para os filhos e cônjuge. Multiplicaram-se e muito os programas, são infindáveis. Até os líderes das igrejas da idade média se ouvissem tais coisas se assustariam.
Adição. Ainda outras igrejas somaram. Além dos 3 itens colocaram ajuda a missões, o que é extremamente positivo. Começaram a pensar na informalidade do lar, com os grupos nas casas, denominando-os: grupos familiares, grupos de comunhão, células, enfim. Implantaram ministérios para que os crentes tivessem um meio de desenvolver seus dons. Colocaram também estranhas adições como inúmeros apetrechos nos cultos, chegando ao ponto de realizarem culto para “trocar um anjo mais fraco por um mais forte”, "reunião da revolta", "Do descarrego". Entre outros, que você conhece muito bem.
Divisão. Outras igrejas, ainda, dividiram. Fragmentaram-se em inúmeras comunidades. Insatisfeitos com a liderança (a mesma que normalmente invejavam), com a monotonia, com a teologia, com os 3 itens acima, porém o mais triste é que com raras exceções eles melhoraram alguma coisa. Via de regra, se degradaram transformando-se em homens prepotentes, mesquinhos, hierárquicos, cheios de mística anti-bíblica e idolatrados por uma massa acéfala.
De qualquer forma, mesmo que quaisquer destes grupos aproximem-se mais ou menos da verdade, ou até mesmo, desviem-se totalmente dela, poucos conseguiram chegar à essência. E para expressar melhor o que pretendo dizer, passo a descrever uma ilustração que me fez pensar seriamente sobre a vida e o propósito da igreja, para que também o membro identifique o seu papel nesta.
Certo Senhor ao sair de viagem, pediu a seus servos que trocassem o telhado da casa, pois o mesmo estava em péssimas condições. Dada a ordem viajou e os seus servos puseram-se a trabalhar. Passado o devido tempo retorna da viagem aquele senhor. Ao chegar na rua onde sua casa está localizada percebe o passeio totalmente novo e com um designer moderno. O muro muito bem pintado. Aciona o controle remoto, entra pelo portão da garagem e vê que o jardim está podado e com algumas plantas novas. A casa recebera uma pintura totalmente nova. Ao entrar pela sala a mesma estava lindíssima e organizada. Na copa havia um delicioso jantar a mesa. Esse senhor então maravilhado olha acima e percebe através dos buracos no forro que o telhado continuava velho e perigoso como quando saíra de casa.
Então indaga aos servos. O que houve? Por que não arrumaram o telhado? Estes disseram-lhe que começaram a arrumar o passeio, muro, jardim, pintura das paredes e por isso não sobrara tempo para fazer o que o senhor havia pedido. Os servos estavam muito ocupados e preocupados em fazer o periférico, não o essencial. Assim, não reformaram o telhado. Imagine como deve ter ficado aquele Senhor?
A conclusão é: por muito tempo e repetidas vezes essa história tem se repetido com a igreja. As últimas palavras de Jesus antes de retornar ao Pai, registradas por Mateus (28.18-20), se resume em “ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações... ensinando os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado...”. Como igrejas nós freqüentamos as reuniões, ofertamos, alguns remodelam o caráter, fazemos inúmeros programas, temos inúmeras festas e comemorações, reuniões sem fim, mas dificilmente e com raríssimas exceções fazemos discípulos. Semelhantemente aqueles servos, somos ótimos para arrumar passeios, muros, jardins, fazer pinturas, jantares entre outras, mas arrumar o telhado!... Ah, vale lembrar que arrumar o telhado dá trabalho. É complicado... é perigoso... podemos ter decepções... afinal, pensamos, nosso Senhor é bonzinho, não será tão rígido conosco quando formos prestar contas de nossa vida. Até parece que o Senhor Jesus deixou Mt 28.21 que diz: "é brincadeirinha tudo o que disse".
A minha oração é: Deus tenha misericórdia de nós, especialmente dos lideres, para que primeiro sejamos os exemplos em fazer discípulos, pessoas que vivam e ensinam a Palavra na vida cotidiana. Segundo, que fazendo discípulos de Jesus, não nosso, possamos ao mesmo tempo treinar tais pessoas para discipular outros, multiplicando-nos na vida de outros. Possamos seguir a recomendação de Paulo a Timóteo (2 Tm 2.2). “E o que de minha parte ouviste através de muitas testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para instruir a outros”. Discipular, uma das funções mais primordiais e urgentes para um membro da Igreja de Jesus se engajar. Arrume o telhado.

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